“Viver ultrapassa qualquer entendimento.”
Clarice Lispector
Sinto-me aspirante de coisas mais nobres. Mas aspiro a uma nobreza fora dos conceitos sabidos de hoje; uma nobreza que é invisível aos olhos. Por isso, estou sendo capaz de deixar uma “vidinha” que aparentemente seria mais segura, confortável, palpável e certa. Virei-me contra a correnteza deste mundo, e agora realizo o movimento inverso. Como tantos, fui desafiado; mas como poucos, aceitei. Nunca me contentei com o pouco. Corro riscos, sinto medo. Mas sonhos sem riscos trazem conquistas sem méritos. Viver é arriscar-se.
Destarte, é em grande parte devido ao sobredito que aceitei um chamado e estou inteiro para uma experiência passo-a-passo na vida religiosa. Uma vida construída; uma família constituída. Quero viver minhas etapas... todas elas. Posto que, não existe o caminho, o caminho se faz ao caminhar. E não estou sozinho; aliás, não irei a lugar algum sem os laços de fraternidade ainda iminentes – meus irmãos. De fato, já dizia Sartre que “o homem tem consciência da sua existência através do olhar do outro, e vice-versa”. Tudo isso hoje se torna o meu sonho, parte de meus ideais. E desejo ir a fundo, prefiro o que é profundo. Não gosto de água com açúcar. E não estou partindo simplesmente porque quero; antes disso, me vejo sendo levado por uma Força maior do que eu, e que, portanto, transcende-me de um modo absurdo. ‘Ele me venceu’.
No fundo, somos todos como Abraão, rumo ao monte Moriá; sozinhos em nossas escolhas e renúncias, sendo que a escolha de algo é necessariamente renúncia de outro. A vida é isso: um constante “trade-off” entre escolhas e as perdas e ganhos que as acompanham. E ainda, cada atitude é uma tomada individualmente; somos existentes singulares e ninguém pode tomar nossos passos, que inclusive estão sempre para serem dados.
Eis o paradoxo da existência: a liberdade que é inata nos condiciona sempre à tomada de decisões; e muitas vezes não suportamos o suficiente para sermos autores das mesmas, permitindo assim que a própria vida e os outros escolham por nós; e de fato, se não cuidarmos a vida leva. Digo com Kiekegaard que a angústia que me ronda hoje neste peito inquieto é apenas vertigem da felicidade construída que me aguarda nestes primeiros passos que dou em busca de uma vida íntegra e iluminada.
O importante de tudo é reconhecer que o peso de se viver (intensamente) é inevitável. Contudo, devemos erguer a cabeça ao alto, e acreditar que através das experiências profundas e absurdamente humanas com o Deus presente no outro – pela gratuidade do "ser-com" – conseguiremos (re)construir-nos continuamente em direção ao "feliz” e então dizer, gritar que: A VIDA É BEM MAIS QUE ISSO, E VALE A PENA SER VIVIDA!
“A vocação é um arriscar-se nas mãos de Deus”. E eu o faço.
Eis que aqui estou!
Fiat voluntas tua!
Gabriel Nascimento
Belo Horizonte/MG